O desequilíbrio econômico financeiro em contratos de obras e serviços

Tempo de leitura: 6 minutos

O jurista Hely Lopes Meirelles1 definiu de forma muito completa o conceito de equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos:

O equilíbrio financeiro, ou equilíbrio econômico, ou equação econômica, ou, ainda, equação financeira, do contrato administrativo é a relação estabelecida inicialmente pelas partes entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração do objeto do ajuste. Essa relação encargo remuneração deve ser mantida durante toda a execução do contrato, a fim de que o contratado não venha a sofrer indevida redução nos lucros normais do empreendimento. Assim, ao usar do seu direito de alterar unilateralmente as cláusulas regulamentares do contrato administrativo, a Administração não pode violar o direito do contratado de ver mantida a equação financeira originariamente estabelecida, cabendo-lhe operar os necessários reajustes econômicos para o restabelecimento do equilíbrio financeiro. Trata-se de doutrina universalmente consagrada, hoje extensiva a todos os contratos administrativos.

Hely Lopes Meirelles

Em suma, o princípio do equilíbrio econômico-financeiro visa garantir a manutenção da equação econômica inicialmente contratada. Para isso, deve ser mantida a proporção entre os encargos imprescindíveis à execução da avença e a remuneração pactuada. Finalmente, fica vedado o enriquecimento sem causa de uma das partes.

Em outras palavras, deve haver uma relação de equivalência entre os serviços prestados pela contratada e a respectiva remuneração. Em termos contratuais significa dizer que o contrato será cumprido rebus sic stantibus (estando as coisas como estão). Dessa relação de equivalência, surge o conceito de equação econômico financeira.

Essa equação se materializa com a apresentação da proposta e assinatura do contrato e é representada pelos elementos de orçamento e demais condições contratuais.

equilíbrio econômico financeiro

Por fim, o princípio do equilíbrio contratual se traduz no dever de renegociação imposto aos contratantes. As partes têm, portanto, a obrigação legal de renegociar os termos do contrato em caso de perturbações que afetem esse equilíbrio.

Sumário

O que causa o desequilíbrio econômico financeiro de um contrato?

Obras de engenharia frequentemente têm sua execução afetada por fatos imprevisíveis, que fogem ao controle das partes. Tais fatos caracterizam-se pela alteração das condições contratuais de forma extraordinária. Como exemplo, podemos citar condições climáticas adversas, erros de projeto, greves, etc.

Nesses casos, a excessiva onerosidade não pôde ser prevista pelas partes por não ser viável ou por ser impossível diante da boa técnica de engenharia.

Desequilíbrio econômico financeiro: desproporção entre os encargos e a remuneração
Desequilíbrio econômico financeiro: desproporção entre os encargos e a remuneração

Também é muito comum que a execução do contrato seja impedida ou retardada pela ação ou omissão da parte contratante quando esta deixa de cumprir suas obrigações contratuais.

Casos fortuitos, força maior e fatos do príncipe também podem ser responsáveis por impactar a equação econômico-financeira inicial do contrato. Tais externalidades compõe a álea extraordinária do contrato e são responsáveis por causar um desequilíbrio econômico-financeiro no contrato.

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O desequilíbrio econômico-financeiro do contrato pode ser demonstrado a partir do estabelecimento de um nexo de causalidade entre as externalidades contratuais e seus reflexos na equação econômico-financeira do contrato.

Tais reflexos podem ser responsáveis tanto pelo aumento dos custos diretos devido à perda de produtividade, quanto pelo aumento dos custos indiretos devido à extensão do prazo.

Álea extraordinária

A álea extraordinária corresponde aos riscos não assumidos pela parte devedora da prestação. Estes não são assumidos por ser impossível prevê-los ou por decorrer de uma alteração das circunstâncias econômicas previstas no momento da celebração do contrato. São exemplos de riscos extraordinários:

  1. Ação ou omissão da contratante com descumprimento de obrigação contratual;
  2. Eventos imprevisíveis ou fatos de terceiros cujos efeitos sejam impossíveis de serem evitados ou impedidos;
  3. Condições da natureza cuja boa técnica de engenharia não seja capaz de prever. Por exemplo, desastres naturais, riscos hidrológicos e riscos geológicos. Tais eventos costumam fugir das probabilidades estatísticas ou são impossívels de serem investigados previamente;
  4. Fatos do príncipe, tais como alterações na legislação tributária ou ambiental;
  5. Caso fortuito ou força maior.

É essencial que seja demonstrada uma relação de causa e efeito entre a onerosidade excessiva e o evento que a originou.

O Código Civil2 estabelece o direito de resolução do contrato em caso de onerosidade excessiva:

Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato.

Contudo, o mesmo dispositivo legal prevê que a resolução do contrato pode ser evitada caso as condições do contrato sejam alteradas:

Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato.

Nesse sentido, modificar equitativamente as condições do contrato significa restabelecer o equilíbrio econômico financeiro.

Como reestabelecer o equilíbrio econômico financeiro (ou como recuperar os prejuízos)?

Quando ocorre um evento responsável por aumentar os encargos do contratado, a equação econômico financeira inicial é impactada. Esta deve ser restabelecida com o aumento da remuneração, de forma a reequilibrar o contrato.

Diversas empresas e profissionais acreditam que não seja possível recuperar os prejuízos de suas obras. Outros acreditam que pleitos implicam, necessariamente num desgaste com o cliente. Contudo, a realidade mostra que muitas empresas têm sucesso em negociar novas obras mesmo após a apresentação de um pleito.

Embora a tentativa de compensar os prejuízos negociando a inclusão de novos serviços ou até a contratação para outras obras seja válida, nem sempre é suficiente para recuperar a totalidade dos prejuízos. Sobretudo, por não serem raros prejuízos maiores que 30% do valor do contrato.

Portanto, um pleito bem fundamentado é a ferramenta mais indicada, tanto pelo potencial de recuperação dos prejuízos, quanto pelo suporte para defesa de eventuais multas por descumprimento de obrigações contratuais.

Finalmente, a apresentação de um pleito pode até ajudar nas negociações com o cliente para execução de novas obras.

E aí, ficou alguma dúvida? Poste nos comentários.

Referências

  1. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 26ª edição, São Paulo, editora Malheiros, 2001.
  2. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil

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